quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Guatemala - Artigo

 

 

Aterrámos numa explosão de cores, aromas e lindos fatos tradicionais. Aterrámos em plenas festas religiosas em honra da Santa Guadalupe, um bom augúrio para o que seria a nossa primeira viagem como viajantes independentes. Tínhamos na mente, o que julgávamos, iria ser o ponto alto da nossa viagem – Tikal, uma das maiores e mais emblemáticas cidades Maias. O facto é que este país nos iria surpreender com uma série de pontos altos! Aterrámos na GUATEMALA.

CURIOSIDADE RECÍPROCA

Tivemos a sorte de vivenciar as festas da cidade da Guatemala, a capital do país. Assistimos, estupefactos, a procissões com impressionantes andores carregados por cerca de 40 pessoas, devotos fervorosos de uma fé imposta há 500 anos. Num passo lento e cadenciado o andor é, propositadamente, balançado lateralmente por alguém. É patente o sofrimento na cara, suada, de quem carrega tamanho fardo e mais uma vez nos impressionamos. Para conhecer realmente um povo, nada como as festas populares e… a sua comida. Iniciámos desde logo as nossas experiências gastronómicas que não pararam durante toda a nossa estada – come-se bem na Guatemala. A nossa curiosidade estava no auge pois a estas festas acorrem os habitantes de lugares mais rurais que habitualmente não vêm à cidade. Éramos também alvo de curiosidade e tentativas de comunicação, nem que fosse através de sorrisos tímidos. Estas festas fizeram com que a cidade tenha valido a pena, pois para além de alguns edifícios coloniais bonitos, a capital não tem muito interesse.

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TEMPLO DO GRANDE JAGUAR

Partimos para a fabulosa Tikal, de autocarro, numa viagem nocturna desconfortável que nos demorou 9h. O parque nacional de Tikal está numa zona protegida de 576Km2 que contém milhares de ruínas Maias. A área central da cidade chegou a ocupar uma extensão de 16Km2 e possuía mais de 4000 estruturas. Tikal assenta num monte de escassa altitude, com um assombroso cenário de altas pirâmides que despontam em direcção ao céu, rompendo a frondosa selva. O impressionante Templo do Grande Jaguar continua, pela sua grandiosidade, a honrar o rei para o qual foi construído. Tikal contém uma série de pirâmides e nem o calor intenso e humidade asfixiante, nos dissuadem de subir às permitidas. Subimos as vertiginosas escadas do templo IV com 64m de altura ansiosos de absorver e reter na memória a preciosa vista. Tikal ficou para sempre no nosso coração e nem mesmo outras cidades Maias, visitadas posteriormente e numa outra viagem, conseguiram diminuir aos nossos olhos a sua mítica beleza. clip_image006

EM BUSCA DE AGUATECA

Rasgando a fechada selva, pelo rio de la Pasion, vamo-nos cruzando com as pessoas que fazem do rio um parceiro. Parte integrante da sua vida diária, o rio serve para se banharem, lavarem roupa, pescarem ou simplesmente, para alegres e barulhentas crianças brincarem. Chegamos a Ceibal, mais uma cidade Maia em ruínas e com a maior comunidade de melgas que se possa imaginar! Estes insectos são tão numerosos que nem todos os repelentes em conjunto, naturais e químicos, surtem efeito. Mas, talvez, isso seja parte do seu atractivo. Ainda de barco, agora por um afluente do rio de la Pasion, enfrentamos as pronunciadas curvas do rio Petexbatún, em busca de Aguateca. Escondida no coração da selva, no alto de uma colina, esta cidade é naturalmente defendida por uma fortaleza natural de escarpados e barrancos. Uma palavra se forma nos nossos lábios: belíssima. Mas aqui, apesar de tão difícil acesso, testemunhamos o acto vil de tentativa de roubo. Um ladrão, na calada da noite, danificou uma bela estela (coluna esculpida), tentando, sem sucesso, cortar uma das partes em relevo. Ficamos maravilhosamente alojados num lodge, na lagoa de Petexbatún. Não pelo seu luxo (que não tinha nenhum), este lodge encantou pelo seu ambiente familiar e acolhedor, em perfeita harmonia com a selva circundante. Assistimos deleitados a um filme rodado neste preciso ambiente e com “actores” locais, como o chefe da polícia e o “nosso” cozinheiro que mostra um sorriso desdentado e orgulhoso quando o reconhecemos e felicitamos. O filme, embora de baixos recursos, conta com uma excelente realização, dando enfoque a problemas tristemente actuais, como os fogos postos para a criação de pastagens e a caça furtiva a animais em vias de extinção como o Jaguar. Ainda no ano anterior, por aquelas mesmas traves do tecto, passeava um Jaguar semi-domesticado (também protagonista no filme) que, por não ter medo do homem, se deixou matar por ignóbeis caçadores.

MIRANDO ÁGUA, FUEGO E ACATENANGO

Saindo da selva vamos para uma das cidades mais bonitas da América do Sul – Antígua. Com bonitos edifícios coloniais restaurados, envolvidos por floridas buganvílias, é rodeada por três vulcões. Adormecidos, mas não extintos, Água, Fuego e Acatenango impõem-se e a esta cidade. Completamente destruída em 1773, Antígua foi sendo recuperada e é agora “monumento nacional”, reconhecida pela UNESCO como Património Cultural da Humanidade, em 1979. Os fervilhantes habitantes ignoram propositadamente a omnipresente ameaça, continuando a sua laboriosa vida.

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BICADA NOS “CHIKEN BUS”

Apanhamos mais um dos numerosos e desconjuntados “chiken bus” (autocarro das “galinhas”). Os autocarros são um cartão-de-visita da Guatemala. Antigos autocarros de escola dos EUA, os seus bancos foram substituídos por outros mais compridos, deixando um espaço exíguo de “passagem”. A sua designação provém da quantidade de galinhas transportada, pois os guatemaltecos vivem muito à base desta ave.

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As galinhas andam assim em constante viagem, bicando qualquer desafortunado que se procure segurar dos solavancos. O facto de estarmos tão espalmados entre uma quantidade exasperante de pessoas e carga, faz-nos (felizmente) alhear da perigosa estrada serpenteante. Procuramos esquecer as notícias que falam de mais um autocarro na Guatemala que caiu pela ravina, sem sobreviventes, e procuramos achar alguma graça ao ajudante que por vezes corre ao lado do autocarro para pôr água nos travões! Típicos (e perigosos) estes autocarros levam-nos a qualquer ponto da Guatemala e a qualquer hora. Basta para isso estar em qualquer ponto da estrada e ouvir os gritos do ajudante que pendurado na porta anuncia as terras por onde passa: “Guate, Guate, Guate… Xela, Xela, Xela…”! Nada mais eficiente!

BELEZA E SUSTO

Já em Panajachel, visitamos um dos enclaves naturais considerado dos mais bonitos do mundo. Mais um ponto alto da viagem, o Lago Atlitlán! Rodeado por vulcões, este lago tem a sua origem na erupção massiva de Los Choyos, há 85.000 anos. A quantidade de magma expulso provocou que o terreno à superfície se fundisse, formando uma cova circular de 30m de profundidade, que prontamente se encheu de água. Passeamos a pé, rodeando uma parte do lago, atravessando pequenas povoações alegres e grandemente coloridas, como tudo na Guatemala. Os vulcões ilustram a paisagem, reflectindo a sua imagem no calmo lago como se de um postal se tratasse. Bebemos sofregamente toda esta beleza até à hora do último barco, no final do dia. Mas, agora, o vento fustiga o lago, criando uma ondulação nada simpática. Os bonitos vulcões parecem agora tenebrosos e as águas ameaçadoramente escuras. Desapertamos os atacadores das botas e olhamos ansiosos para os estragados coletes salva-vidas. Sabemos como é difícil nadar naquelas águas, tínhamo-lo feito de tarde. Respiramos novamente quando atingimos o longínquo cais e planeamos de imediato no dia seguinte voltar. Só que regressaremos ainda com o sorriso do sol!

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ORGIA DE CORES

Em Chichicastenago vamos encontrar o grandioso mercado de Domingo. Um espectáculo absolutamente fascinante e genuíno, uma profusão de vida contagiante. Não julgávamos ser possível encontrar ainda mais cor do que aquela que já tínhamos encontrado. Os guatemaltecos devem ser os inventores das cores e conseguem reuni-las quase todas nos seus maravilhosos têxteis. Com intrínsecos padrões e fascinantes cores, criam trajes lindíssimos. Resistimos à tentação de comprar, para não termos de carregar com o fardo. Partimos para Quetzaltenango, (“Xela, Xela, Xela”…) e procedemos à ascensão de um vulcão, o Stª Maria. Partimos de madrugada e levamos 5h a atingir o seu cume, para… não ver absolutamente nada! Um véu espesso de nevoeiro, provocado pelas pequenas mas constantes erupções, apenas nos permite ouvir, ali mesmo ao lado, o rugir do Santiaguito (2.448m), tubo de escape do Stª Maria. Que desilusão!

DE MOLHO QUENTINHOS

Vamos “afogar” as nossas mágoas nas Fuentes Georginas. Este manancial de águas termais é constituído por quatro piscinas de distintas temperaturas. Alimentadas com a água das fontes termais sulfurosas, é rodeada por uma pronunciada parede, coberta de vegetação tropical, alimentada pelo vapor constante. Mais uma das fabulosas paisagens naturais da Guatemala! Aventuramo-nos ainda pelo norte deste país, região de paisagens surreais, onde as montanhas enclausuram pequenas localidades de terracota. Sentimos na cara o respigo das inúmeras cascatas, quando atravessamos os campos de milho. Esta zona, das mais pobres do país, sofreu muito com a guerra civil (até aos anos 80). A sua população é muito jovem pois, grande parte dos adultos válidos morreu na guerra. Não obstante, há sempre um sorriso à nossa passagem.

UM PULINHO ÀS HONDURAS

Regressamos a Antígua e fazemos desta linda cidade, a base dos dias que nos restam na Guatemala. A partir daqui, damos um “pulinho” às Honduras, para visitar mais uma fascinante cidade Maia. Cópan é dos sítios arqueológicos Maias melhor conservados. Destaca-se pelas inúmeras e bem esculpidas estelas, assim como pelos bem recuperados edifícios e Jogo da Pelota. Para aqui chegarmos, apenas com motorista/guia, tivemos de enfrentar uma perigosa estrada, visitada frequentemente por zangados guerrilheiros. Não eram brincadeira os avisos de nos baixarmos imediatamente, não queríamos uma bala perdida no nosso corpo!

AGORA SIM, O VULCÃO!

Para despedida, e para apagar o gosto amargo do Stª Maria, procedemos a mais uma ascensão a um vulcão. Outro dos pontos altíssimos da nossa viagem! Nos arredores de Antígua, subimos a negra paisagem do Pacaya (2.552m). No topo, abre-se aos nossos olhos o espectáculo de um resfolegante vulcão que, de vez em quando, cospe. A incandescente lava é acompanhada de gases venenosos que fazem chorar os nossos olhos, já húmidos de emoção. Quedamo-nos, ao lado de outros intrépidos curiosos, mais tempo do que o aconselhável, incapazes de nos separarmos daquela visão mesmerizante.

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Despedimo-nos da Guatemala de alma cheia. Variadas e fabulosas paisagens, mítica cultura perdida, deliciosa cultura moderna, boa e exótica comida, facilidade de transporte e alojamento. Um alegre e colorido AMIRÁVEL DESTINO!

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